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Racismo estrutural: uma tese errada que atrapalha a luta das minorias

O racismo “estrutura o Brasil” – essa é a tese. Errada. E desse erro nasce um pior: conclui-se, junto com o autor da expressão nociva, que “o brasileiro é racista”. Você é racista, sabia? Imputam isso. E aí você tem que aceitar que é racista, mesmo não sendo. No passado, ninguém era racista. Agora, todo mundo é racista. Saímos de uma mentira para outra. Uma armadilha do homem do ressentimento. Não adiantou Nietzsche nos avisar que cairíamos nisso como homens modernos!

Há pessoas que adoram desqualificar o brasileiro. A tese do racismo estrutural é uma das formas dessa desqualificação.

Mas nosso país não é racista no sentido de que suas estruturas todas são racistas. Aliás, em termos mundiais, temos muito mais vantagem que outros povos. Temos uma Constituição que não permite o racismo (outras constituições democrática são dúbias), temos leis contra ele e de fato criminalizamos o racismo. Além disso, temos políticas de cotas para que o racismo seja diminuído. Se ele fosse estrutural, dado que o racismo é crime, teríamos que criminalizar todo o país. Como se vê, a tese é incongruente. Não serve como tese. O país não é um país criminoso.

Por isso temos esperança. Nossas leis reconhecem o racismo na nossa cultura, mas mostram claramente que o racismo não é o pilar da República, não estrutura a cultura e a vida de nosso povo. A palavra estrutura não cabe. Ela amarra o Brasil como estado-nação a uma situação que, caso fosse verdadeira, nos envolveria em situações como a de outros povos, que promovem o racismo ou que o perdoam. Nossa vida legal mostra que não somos racistas “estruturalmente”. Quando a polícia racista mata mais negros que brancos, nós, brasileiros, nos revoltamos. Quando vemos preconceito, nós nos revoltamos. Quando um presidente se elege e se mostra racista, nós votamos noutro. Então, o Brasil não é racista.

Lutamos contra o racismo exatamente porque ele não é a estrutura de nossa vida e de nossas instituições. Lutamos contra ele a partir de nossas estruturas. Temos racismo, e por vários motivos ele se acoplou fácil, especialmente pós-escravidão, ao mandonismo colonial que também perdurou, e até aumentou logo após a abolição da escravatura. Mas o brasileiro não é racista em geral e muito menos o racismo estrutura nosso país. Pergunte a você mesmo se você é racista – responda por você.

Mas há aqueles que, mesmo nunca passando por situações de preconceito, vão sempre querer qualificar o Brasil como racista, sempre vão querer colocar todos os adjetivos ruins no país. O ressentimento é realmente uma chaga. Pior ainda, quando o ressentimento é a respeito do outro.

DEFENDO ENCARNIÇADAMENTE A POLÍTICA DE COTAS, exatamente porque sei que o racismo existe. Mas exatamente por termos políticas que combatem o racismo, sabemos que ele não nos estrutura, que conseguimos fazer leis antirracistas muito antes que vários outros países que se propagam mais igualitários e “mais desenvolvidos” que nós.

A tese do “racismo estrutural” é fundamentalmente uma forma de nos colocar para baixo. Muita gente usa a expressão “racismo estrutural” e não se pergunta: “ué, se o racismo estrutura tudo, então, sou eu racista?” E ao perguntar isso, iria perceber que não é racista. É isso que a tese quer negar, ela quer culpar o brasileiro, e não resolver o problema do racismo. Ela é da ordem do ressentido, não a ordem da construção de uma utopia sem racismo.

A POLÍTICA DE COTAS ÉTNICAS É NECESSÁRIA. Mas, aqui, também devemos dissolver erros. Ela não se destina a promover indivíduos de minorias. Ela não é para isso. Muito menos ela serve para pagar “dívida histórica”. Se fosse assim, seria um escárnio, pois o que se fez com negros e indígenas foi um mal sem qualquer preço. É um mal impagável. As cotas são feitas para INTEGRAÇÃO. Para que o território e o tempo, ocupado pelo herdeiro mais direto do colonizador e o herdeiro mais direto da imigração mais bem adaptada, também possam ser ocupados igualmente por negros e indígenas.

Uma vez integrados, sem que sua cultura de origem seja esmagada, as minorias contribuem para que vida toda da nação ganhe pluralidade e riqueza, e menos situações de ódios vão se verificar. Desse modo, as cotas são uma política temporária. O tempo delas pode até ser longo, mas elas não serão eternas, pois o racismo deverá cair, e já está caindo no que tange a eficiências das cotas. Agora, que as cotas não substituam de forma alguma uma dívida social que o país tem consigo mesmo, que é a de fazer a escola pública de qualidade um elemento para todos os brasileiros. Esse é o lado que ainda anda descuidado. E nessa hora, tenho que confessar: não temos melhorado nosso desempenho escolar diante de outros povos, e nossos professores continuam mal pagos.

Paulo Ghiraldelli

3 comentários em “Racismo estrutural: uma tese errada que atrapalha a luta das minorias”

  1. Ghiraldelli, creio que seu argumento instrumentaliza a ação antirracista de maneira estratégica. É necessário entender a linguagem (radicalmente) para lidar com a realidade com profundidade. Se permanecermos mergulhados na ideia de racismo estrutural identitária em voga, careceremos de recursos teóricos para combatê-lo com a necessária habilidade cirúrgica. Debrucemo-nos em leituras de Ricouer, Dewey, Freire… ciceroneadas por Ghiraldelli.

    1. Vdd Pablo, acredito que vc esteja se referindo ao professor (no singular) Fernando Henrique Cardoso, ou algum outro livre docente de uma grande universidade, tenho dúvida se trabalha ou trabalhou (no caso do FHC ou outro aposentado) pouco, mas esse professor aí ganha bem mesmo. Mas, vale esclarecer que o Ghiraldelli se referiu desavisadamente a professores (no plural), aí subentende-se que são a maioria, ou seja, o grosso da categoria, aí temos que falar dos que atuam no ensino básico, na vdd são professoras. Se vc consultar pelo portal da transparência, por exemplo, do Estado de São Paulo, a maior rede escolar do Brasil, vai tomar um susto ao ver os salários. Ainda assim, pode ser que aconteça o contrário, você se anime tanto em entrar para a docência ou a incentivar os jovens que conhecem a fazê-lo, afinal quem não quer um trabalho de tanto prestígio + privilégios

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