Um amigo me escreveu insistindo que eu tenho que ouvir DJs, cantores de funk e coisas do tipo, ou seja, gente que fala na periferia. Eu teria que saber o que eles falam, pois eles “comandam as pessoas das favelas”. Ele disse que estou enganado ao não dar atenção a tais pessoas. Eis aqui minha resposta em carta aberta para esse amigo.
Querido amigo, você é que está ENGANADO. As opiniões que ficam não são essas dos ídolos da periferia, e sim os da grande mídia na parte em que tais opiniões estão ligadas originariamente ao saber dos letrados, dos escolarizados. Basta ver as estatísticas. E basta ver a história. Qual grande movimento um cara desses, um cantor de sucesso com funk, criou na história? Nenhum.
Falo de modo didático, um pouco grosseiro: o mundo é dividido politicamente entre esquerda e direita, ou seja, Marx e Adam Smith, os grandes filósofos. É isso que move o mundo. Você está navegando na ideologia da mídia, no superficial, por isso você não percebe o movimento da vida mais sofisticado, feito pelos intelectuais, que buscam entender o que se passa na história e ao mesmo tempo tomar a defesa de certas instituições, pessoas e ideias que se apresentam nessa história.
Enquanto você navegar nos rios dos “influencers” por conta de achar que isso move a opinião, você estará apenas no boteco, não vai perceber senão o que lhe chega a partir do que você toma como importante no balcão do boteco. Agora, quando você vê a política funcionando em suas entranhas e também no âmbito da organização dada pelos intelectuais, aí muda tudo. No máximo esses carinhas que você vê cantando coisas da periferia e para a periferia influenciam no sapato que alguém usa. Vendem coisas, ganham dinheiro, mas não mudam nada na estrutura social. Nem mesmo mudam a alienação das pessoas. Eles nem alienação causam! Agora, o que move o mundo são as grandes ideias; nessa hora, um carinha desses a quem você confere grande popularidade, passa por fora. É uma pena que o canal nosso, o da Esquerda Reflexiva, ainda não tenha lhe ensinado isso, você está ainda preso à mídia do show. Afinal, em uma sociedade em que o espetáculo é a mercadoria, você acaba por cultivar a sociedade do espetáculo. O show é derivado do show da mercadoria.
Na hora de participar da política, por exemplo, em uma eleição, são os grandes temas filosóficos que contam: inflação, privatização, salário mínimo, direitos trabalhistas, etc. Aliás, nem precisa ir longe, basta ver as estatísticas e notará quais as preocupações do povo brasileiro. A preocupação popular não passa em nada perto do que esses caras, os artistas da periferia, falam. Alguns deles até falam de “temas sociais”, mas de modo tão desorganizado que não deixam nenhum rastro efetivo. E não adianta falar de inflação em música. O que vale é o que Lula fala, o que Bolsonaro fala, e eles não falam senão dos grandes temas que os filósofos trataram, principalmente a administração do estado e o modo de organizar a sociedade. Cada um deles fala o que foi falado pelos intelectuais, mesmo que não os tenham lido. Eles são líderes porque falam a voz das correntes que tiveram os intelectuais como organizadores. Lula fala pela esquerda, Bolsonaro pela direita. Falam o que herdamos, por várias vias, de Marx e Smith. Não falam pelo que herdamos de cantores do passado que vomitaram cultura popular ou cultura de massas, ainda que, na retórica deles, elementos dessas culturas possam aparecer para adornar os discursos.
A escola é importante exatamente porque ela mostra isso, enquanto que o autodidatismo de um Mano Brown, por exemplo, fica no superficial. Não dê tanto valor à merda, ela é, de fato, uma merda. Você confunde o sucesso de mídia, momentâneo, com história. História e movimentos que fazem história não surgem do sucesso de mídia. Ronald Reagan era um sucesso de mídia, foi presidente, mas ele não fez história a partir do que ele tinha na cabeça como ator e sucesso de mídia, ele fez história a partir do que os filósofos que ele seguiu disseram, e foi esse o programa que movia o dinheiro que o apoiava na época.
Não é o Sílvio Santos ou o DJ Sei-Lá-O-Que que colocam os movimentos para funcionar. São as grandes concepções sobre a vida, sobre a sociedade, sobre o estado etc. que dão rumo para os acontecimentos. Essa é a matéria dos letrados. Os letrados movem o mundo, os iletrados fazem pirâmides para os letrados, e sob regime escravo! Se um DJ ou um rapper fala na favela coisas como “eu venci”, e então muita gente acredita e quer vencer do mesmo modo, cuidado aí! Não é ele que propaga a ideologia. Ele é que está ali por conta da ideologia neoliberal que já está, antes dele, na favela; é por conta do movimento do capitalismo, de Reagan, e de Hayek.
São os dispositivos, teorizados por Foucault, que fazem o funcionamento da história ser o que ele é. Um dispositivo é um conjunto de práticas e discursos, instituições e organizações. O neoliberalismo na favela não aparece pelo cantor que se põe como self made man e mostra que agora tem tênis de luxo e anda de carrão, isso é o superficial. A ideologia se faz vigente por conta de gente assim, mas gente assim só é canal de ideologia porque antes o banco já estava na favela e ele, como instituição, instaurou uma prática. Ele, o banco (ou o agiota local), dá crédito para uns e não para outros, e ele fornece mais meios para compra para quem tem crédito. A prática do crédito é a ideologia, mais do que o discurso. É como na religião: a prática de fazer a genuflexão é mais ideologia religiosa que o texto bíblico. Mas os dois caminham juntos. Um pastor tem sucesso se essas práticas já estão na sociedade em que ele quer atuar como “influencer”.
Se quiser ajudar o canal da Esquerda Reflexiva, meu amigo, ajude o que há de letrado nele, o resto, sinto lhe dizer, não vale muito não. Esses carinhas que você insiste em colocar como objetos de estudo não são heróis do povo brasileiro, nem falsos heróis, eles são apenas a espuma da poluição do rio que corre embaixo. Há vários estudos na Academia sobre ídolos. É uma parte da sociologia. Existe um monte de teses sobre isso. Mas elas são sobre a espuma, na hora de entender um DJ ou um MC da vida, que age como self made man, é preciso saber como surgiu o culto ao self made man. E aí, nesse caso, é o estudo das grandes correntes filosóficas que explica isso. O ídolo não se explica por ele próprio, ou pelo sucesso. Eis aí o que eu ensino no canal.
Paulo Ghiraldelli, 65, filósofo, escritor e professor.
Boa noite professor Guiraldelli!
É impressionante o desprezo nada racional com que vc expressa sua opinião pelas vozes da periferia. Seu tacanho marxismo ancorado em uma filosofia eurocentrica o dissolve ante a realidade concreta das periferias de nosso país. Uma pena!
A sua resposta José não tem nada a ver com o que o professor falou. As manifestações culturais a partir dos artistas “vozes da periferia” , servem como denuncia para diversos aspectos sociais como preconceito, segregação social, etc. Porém, o que o professor fala é sobre como realmente isso influência na história, Marielle é um exemplo de mulher que lutou para realmente influenciar e mudar a realidade da periferia, por esta razão foi morta. Se alguma dessas vozes realmente influenciacem algo de forma política ao ponto de mudar nossa história talvez o professor não tivesse tido essas conclusões!
Concordo com você Cleidson, boa análise, e mostra que realmente entendeu o texto. Infelizmente, o sucesso midiático compra o pensamento das pessoas como o José, que ao meu ver tenta defender de forma afetuosa a fala dos “MC’s ” e a vida dramática que eles passam. O professor quer nos passar uma visão mais ampla do que a letra da música nos leva a encarar superficialmente a vida difícil de um morador da favela. E a frase motivadora que eles falam: ” A favela venceu” , mostra cada vez mais o neoliberalismo entrando nos locais mais simples e consequentemente as perdas de direitos como os trabalhistas e etc. Devemos cada vez estudar mais para que não ovacionemos ídolos de barros.
É isso aí! Faça que nem eu, mande à merda esses DJs, cantorezinhos de funk etc.! O que importa são o Marx, o Adam Smith e os outros caras fodões que o senhor falou aí. Já esses pé-de-chinelo são tudo uns coitado, não fedem nem cheiram! Ôô raça!! …Ô Mano Brown, tu tá lendo isto aqui?! Hahahahahahaha, paiaço!!
Esse artigo me chegou por intermédio de um amigo q seguia o prof e q hj o detesta. Já tentei explicar algumas vezes o pensamento do prof e a forma dele de se expressar. As falas do prof. Ghiraldelli nunca são tão simples. Mas por vezes são inegavelmente carregadas de preconceito, ressentimento e recalque. Porra, eu tbm lamento q ele não tenha o prestígio q deseja e q mereceria em minha opinião, mas, fazer o quê, o tiozão tbm é foda. Ele briga c/ a porra toda e não colabora. Já disse Caetano q “cada um q sabe a dor e a delícia de ser quem se é”. Paciência. Abç a todos, inclusive ao prof, claro.
Creio que na cultura tem vários graus que podem conservar a pluralidade de se manter um registro ou não na história. Isso permite espaço para todo nível de intelectualidade psicológica.
Comparar Silvio Santos com Mano Brown é o mesmo que comparar
Alexandre Garcia com Marcelo Coelho-NADA A VER,POMBRAS!!!!!
E pro Claidson acima,a Marielle foi morta porque se matam políticos no
RJ a granel todo ano.Mas comparar Silvio Santos reaça com Mano
Brown socialista,NADA A VER,POMBAS!!!!!!
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