Não ponha os pés no sofá da sala. Dê lugar aos mais velhos no ônibus. Não fure fila. Não ponha as mãos nas frutas no supermercado. Não ultrapasse o semáforo fechado. Não corte a frente de outros no trânsito. Não desrespeite o professor ou a professora. Não pegue nada que não é seu. Não maltrate animais. Não desrepeite mulheres. Estude. Aprenda uma profissão.
Todos esses conselhos são de mães. Elas impõem regras civilizatórias mínimas. A minha geração ouviu tudo isso. A mesma geração de Bolsonaro. A diferença é que eu, seguindo todos esses conselhos, todas essas regrinhas, só obtive vitórias. Bolsonaro e os bolsonaristas não. Eles sucumbiram diante de todas essas regras. Para eles, a civilização sempre foi um peso. As regras das mães, as normas das mulheres, se confundindo com as normas civilizatórias, nunca puderam ser cumpridas por eles.
O resultado disso explodiu no desejo deles de andar de moto com o presidente. A moto faz alusão à mulher. Bolsonaristas não gostam de mulher. Eles não sabem, mas são misógenos e homossexuais. E são nitidamente homofóbicos. O que querem é montar na moto como quem monta a mulher para submete-la, e não para lhe dar prazer. Ou seja, querem montar a mulher como quem monta nas regras cilizatórias que os derrotaram. Ao mesmo tempo, querem se vingar da mulher, se exibem na moto como se estivessem na cama com a mulher e mais dois colegas. Não querem sexo, querem a curra. A excitação não vem do corpo feminino, mas dos outros homens que o observam. Mais eufóricos ainda ficam se um frustrado e derrotado como eles pode, agora, como presidente, estar junto deles para fingir que não é um derrotado. Se é presidente, não é um derrotado. Querem acreditar nisso. Exibem a companhia do presidente para outros, para a sociedade, para a mulher.
No neoliberalismo os frustrados abundam. O regime da competição desleal e da exploração sem atenuação coloca o homem comum como derrotado. Ele não percebe isso. Ele culpa as normas, em especial todas aquelas que ele nunca conseguiu cumprir, as que foram faladas pela mãe e depois pela esposa, e que já haviam sido reiteradas pela professora.
A revolta desse homem frustrado, o bolsonarista, se faz na moto em desfile. Ali ele aparece como vencedor. Não há mulheres ali. Só os brothers. Ele se excita ao mostrar seu corpo sexualmente disposto sobre a mulher-moto. Ele se oferece ao brother. Ele treme o esfincter ao saber que lá na frente vai o seu presidente.
Paulo Ghiraldelli, 63, filósofo.