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Novo livro* de Janine Ribeiro descreve Lula e Dilma em Plutão

 

Publicado originalmente no blog antigo dia 12/08/2018

Renato Janine Ribeiro lançou pela Editora Estrela, da Folha de S. Paulo, dirigida pelo meu amigo Alcino Leite, o título A Pátria Educadora em Colapso*. O livro busca mostrar uma espécie de história política – com reflexões – do governo Dilma. O herói principal do livro é o próprio autor, como ministro da Educação, por um curto período, da gestão da primeira mulher presidente da República no Brasil. Li a coisa de cabo a rabo na própria livraria Martins Fontes.

Um elemento salta aos olhos: os termos “corrupção”, “Lava Jato” e “Moro” não aparecem. A palavra “Impeachment” é descaradamente tomada como “golpe”. O professor de Ética, que é alguém que já trilhou caminhos acadêmicos próximos ao trabalho historiográfico, se deixa levar pela militância e mata a história. O governo Dilma é apresentado em seu fracasso única e exclusivamente por conta da perda de capacidade de confronto diante de opositores, em um jogo político em que tudo se deve ao problema de Dilma não ser tão boa falante quanto Lula, e de não ter acertado a mão na economia. Janine não consegue admitir um terceiro elemento óbvio: o fato do governo ter se corrompido e, por isso, ter perdido apoio nas ruas. Muito menos compreende o quanto a gestão de Lula, e no primeiro mandato de Dilma, foram irresponsáveis economicamente.

As pessoas que votaram no PT não saíram às ruas para atacá-lo, durante o segundo mandato de Dilma, mas muito menos para defendê-lo. Aceitaram a queda de Dilma e também o Lula na cadeia, pois não conseguiram uma motivação interior para se desinibir em função de um ato sequer em defesa de ambos presidentes, para quem haviam votado um dia – e amado! Mas Janine não conseguiu enfrentar uma verdade tão simples, que todos nós sentimos.

Os não-militantes do PT, mas eleitores do partido, deram uma nova chance à agremiação, após o “mensalão”, confiando no desejo de Lula de eleger Dilma, tomando-o como uma boa sugestão. Mas quando, já no governo dela, a cada ministro que ela colocava para “dar vassouradas na corrupção”, o que aparecia é que o novo nomeado também já estava metido no “petrolão”, então ela realmente minou a fé popular no PT. A força moral de um partido eternamente sem moral nunca é cobrada. Mas a força moral de um partido que durante anos se dizia incorruptível, e que mesmo quando se corrompeu jurou se redimir, quando desaba leva seus principais líderes. Janine nunca foi tão petista quanto nesse tempo de corrupção. Quando mais o PT foi se tornando corrupto, mais ele foi se tornando petista. O livro é um casamento entre o seu petismo máximo, agora desperto de vez, e a prisão de Lula. É um tipo de sado-masoquismo declarado. Mas é também uma visão simplória de tudo, como um eleitor que ainda prefere Lula, na atual circunstância, dado o vácuo político em que vivemos.

A passagem mais engraçada do livro é aquela em que Janine relata de seu primeiro encontro com Dilma. Ele chega e ela diz: “não precisa falar nada professor, conhecemos tudo do senhor”. Se eu escuto um frase dessas de um político, especialmente um político que é mandatário máximo de uma máquina de corrupção denunciada há anos em toda a imprensa, dou um passo para trás e vou embora. Se um corrupto me convida para um cargo e eu aceito, eu espero que no mínimo ele esteja enganado. Mas Dilma deixou claro que “sabia tudo” de Renato! Meu Deus!

O livro se desdobra em traçar um quadro em que Janine se pinta como se ele fosse uma Janaína Paschoal ao contrário. Esta moça não consegue pensar o Brasil senão pelo viés da corrupção. Para ela, existe o Brasil e a corrupção, nada mais. Por sua vez, Janine acha que existe o Brasil, e nenhuma corrupção que mereça ser mencionada, e nada mais. Em ambos os casos à história é negada qualquer conteúdo histórico. No caso da moça, há uma luta contra bandidos do PT, e ela está ao lado do Capitão Bolsonaro, seu herói malufista e defensor da tortura, para se engajar em uma tal batalha para salvar o Brasil. No caso do moço, há uma luta, talvez, meramente entre partidos e programas econômicos, sem que existam pessoas de carne e osso fazendo política, e ele se engaja ao lado dos que poderiam visitar Lula todos os dias para cantar cantigas de ninar ao sindicalista.

O livro de Janine é o mais pobre que já vi a respeito do cena pré e pós Impeachment. Mas tem um valor que é o de mostrar que vários intelectuais são de uma carência sem fim. Como tais pessoas precisam se agarrar a figuras de políticos, quase que como órfãos desesperados pela adoção. Valeria a pena encontrar um intelectual independente que fosse capaz de traçar um panorama dos intelectuais brasileiros incapazes de independência. Daria um bom estudo.

Post Scriptum 1. Ah, deixei escapar as duas únicas informações realmente relevantes do livro: Haddad, que foi o pior prefeito de S. Paulo e o ministro da Educação que gastavam mais em propaganda que nas obras referentes, é elogiado por Janine. E Dilma, segundo ele, o impressionou bem pelo vestido impecável, bela maquiagem e cabelos bem penteados. Ela tem “sangue frio”, escreveu ele, sei lá para que!

Post Scriptum 2. O editor Alcino Leite deve ter engolido um grande sapo.

Post Scriptum 3. Antes de ser ministro, só estando no governo por meio da CAPES, Janine já havia revelado sua forma de agir como político, telefonando para redações de jornais para pedir a cabeça de colegas intelectuais que tivessem escrito qualquer crítica a ele.